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Acorda Portugal: O Bicho da Indiferença

  • policiasdadoxa
  • 17 de jan. de 2021
  • 3 min de leitura

Por Agente Vaicontinuar


70% dos textos com mais de uma página são lidos na sanita. Este número não está sustentado em qualquer estudo científico, tratando-se apenas de conhecimento empírico.

Experiência pessoal, no fundo. É na sanita que leio grande parte dos artigos dos meus colegas de painel e quero muito acreditar que é também lá que o caro leitor me está a ler.

Se me lê a partir da cama ou do sofá, permita-me também cumprimentá-lo. Se me lê a partir de uma esplanada de um café, recordo que no dia em que este texto foi publicado, esse café estava fechado, os hospitais estavam no limite da sua capacidade, entrávamos num novo confinamento e todos acreditávamos que só ia durar um mês.


Apregoámos durante meses que os portugueses foram exemplares na primeira vaga.

Ninguém conhecia o vírus, os números disparavam aqui ao lado e o medo e a incerteza levaram-nos a confinar. Muitas vezes confundida com responsabilidade individual, na primeira vaga fomos exemplares na miaúfa individual.


No início de novembro, defendi aqui que desta vez a solução não passava por incutir medo, sendo necessário redirecionar a estratégia de comunicação para alterar comportamentos. Idealizo um Estado cujo dever passa essencialmente por aqui: informar, consciencializar e recomendar. Sem restrições ou proibições. Mas as últimas semanas disseram-nos que pandemias não se combatem com responsabilidade individual.


A decisão política de relaxamento e alívio das restrições no Natal – contra a opinião de todos os especialistas - passou a imagem de que se não é proibido, pode-se fazer. E se se pode fazer, parece mal não fazer. E se parece mal não fazer, nós fazemos. E nós fizemos. Apertar as restrições no Natal teria maior impacto nas sondagens que o aumento do número de casos. Provavelmente, se fosse hoje a decisão seria a mesma.


O primeiro dia do confinamento geral foi um confinamento parcial. O dever é de recolhimento obrigatório, tirando os casos meramente excecionais como ir à escola, trabalhar, ao supermercado, ao talho, à peixaria, à padaria, à farmácia, ao oculista, à loja de cosméticos, à loja de bricolagem, à missa, pôr gasóleo, arranjar a bicicleta, fazer a inspeção ao carro, comprar tabaco, comprar o jornal ou apostar no Placard.


A maioria foi meramente excecional: o relatório sobre confinamento e mobilidade realizado pela consultora PSE diz-nos que apenas 39,5% da população portuguesa ficou em casa no primeiro dia de confinamento. O que significa que a maioria (60,5%) saiu à rua. Estes números contrastam com os do primeiro dia do primeiro confinamento, em que 61% da população ficou em casa. Esta diferença pode ser explicada pela abertura das escolas e pela quantidade infindável de exceções, mas também por esta banalização da pandemia.


A miaúfa individual do confinamento de março desvaneceu-se com o vizinho que teve tosse e febre como uma gripe, com o colega que só ficou sem paladar, com o amigo que deu positivo mas nem sintomas teve. Tornámo-nos todos um bocadinho negacionistas. Enquanto isto, hospitais em cenário de catástrofe, doentes retidos horas em ambulâncias e relatos dramáticos de profissionais de saúde a fazer 3 turnos seguidos. Banalizámos os números e estamos a passar atestados de indiferença às centenas de mortes.


A situação atual é preocupante. Não adianta estarmos na rua a dizer que a culpa é do Governo, nem o Governo dizer que a culpa é dos portugueses. A culpa é nossa. De todos. O Governo tem de reformular as exceções para o que é realmente excecional, fechando e canalizando apoios para o que não é. E nós temos de ficar em casa.


Não, não vai ficar tudo bem.


Agente Vaicontinuar



 
 
 

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